HERÓI NEGRO?
Com Obama, os negros são vitoriosos, mas não terão um capitão América ou Tio Sam
Ele assumirá o cargo de representante de uma nação que hoje abriga brancos, amarelos, descendentes de negros e de índios. Diversidade tão bem compreendida por ele e por ele simbolizada. Mãe branca, pai queniano; morador , quando criança, da Indonésia; o ex-senador por Illinois leva consigo o retrato de um mundo moderno e globalizado.
Deus o pôs na presidência no momento exato. Alegre coincidência. Justamente em fase de crise econômica mundial aparece um sujeito experimentado e conhecedor de diferentes culinárias, costumes, crenças e povos. Se a união entre nações será a solução, como diz Lula, para encontrar o fim do túnel da obscuridade financeira, Obama terá habilidade para dialogar e reunir muito mais forças mundiais, , como governante da maior potência mundial, do que George W. Bush conseguiu em todo o seu mandato.
A simpatia que o miscigenado político conquistou durante e depois da campanha esteve pairando em diversos pontos terrestres. Na Indonésia e Brasil, por exemplo, manifestada pela declaração dos presidentes locais da admiração pelo democrata e na África transmitida pelo feriado decretado pelo chefe de estado queniano um dia após a vitória de Obama nas urnas. Sem contar as comemorações em várias outras terras, orientais e ocidentais.
A imparcialidade de Obama, quanto a preferência racial, parece prevalecer em sua política.No processo de disputas com Hillary e John McCain nunca defendeu um posicionamento somente a favor de brancos ou negros, até porque ele é uma mistura das duas cores. Mas, mesmo não sendo muçulmano, apesar do sobrenome, nunca vociferou discursos conotando preconceitos para os fiéis do corão ou para etnias.
A promessa de retirar as tropas do Iraque em dezesseis anos não é apenas o reconhecimento do déficit econômico da incursão insensata dos republicanos, mas a característica pacífica da conduta política de Obama. Em uma época que a maioria das guerras contemporâneas não ocorrem mais por questões ideológicas como vem tentando fazer os EUA, mas por problemas étnicos e religiosos.
Protestante, o primeiro presidente negro dos norte-americanos defende o casamento dos homossexuais e o aborto. Posicionamento oposto ao que prega a sua fé. Amostra convincente da facilidade de harmonizar idéias demasiadamente heterogêneas à primeira vista. Um exemplo de esperança para um futuro menos conflituoso.
Na opinião de Michael Hardt, autor de “Império”, livro antiimperialista sucesso entre grupos de esquerda, os movimentos sociais ganham com Obama a oportunidade de produzirem mais frutos. “Nos últimos anos, tivemos de nos concentrar em temas que não deveriam estar mais em questão, como tortura, fechamento de Guantánamo, guerra no Iraque.Esses assuntos agora deixarão de ser motivo de polêmica .Os movimentos sociais poderão ser mais produtivos e terão novas oportunidades de pensar os desafios do mundo atual”, disse em entrevista ao jornal O Globo.
Os negros , no entanto, são os que receberam e continuarão recebendo os maiores benefícios morais conquistados com a eleição presidencial norte americana : A certeza de serem parte dos Estados Unidos e capazes de alcançarem seus sonhos, confiantes em sua força.
“Nosso imaginário coletivo, percepção e auto-estima irão mudar em toda parte do mundo”, afirmou, também ao jornal O Globo, o antropólogo nascido na República Democrática do Congo, Kabengele Munanga, coordenador do Centro de Estudos Africanos da USP.Mas ,segundo ele, “ as pessoas ( de pele escura) continuam vivendo seus complexos e seus problemas individuais”.
Auma Obama, habitante do Quênia e filha de uma queniana com o pai do presidente eleito, comenta a empolgação e expectativa de seus conterrâneos. “Eu acho que foi sensacional a vitória de Barack, mas nós não devemos nos iludir. Ele já disse que é americano. Pode ter simpatia pelo continente do seu pai, mas vai governar levando em consideração os interesses dos Estados Unidos”, declarou Auma em entrevista a agência de notícias Reuther.
A sensata meia-irmã sabe as inúmeras ocupações que Obama terá pela frente para tentar amenizar o caos financeiro da nação campeã em consumo.A preferência será o resgate do crescimento, mas será óbvio que alguns olhares serão voltados --e por que não alguns projetos--ao seu chão paterno.