PLANETA EM MOVIMENTO

terça-feira, 10 de março de 2009

RONALDO E A BOLA MURCHA DA IMPRENSA

TV exagera e transforma gol do craque em um espetáculo; jornalismo dá vexame mas apresenta melhora nos últimos anos


A imprensa brasileira, nos últimos anos, vem registrando uma relação conflituosa em sua própria função. Ora cumpre com sua utilidade pública, ora revela-se completamente insensata e inútil. Um péssimo exemplo ocorreu anteontem, domingo, quando a TV Globo e outras empresas de televisão fizeram do gol do atacante Ronaldo “Fenômeno”, na partida entre Corinthians e Palmeiras, um evento extraordinário.
A emissora da família Marinho deu especial atenção a cabeçada que decorreu no empate do alvinegro paulistano.Parte de sua programação, logo após a transmissão do jogo, foi focada no balanço das redes provocado por Ronaldo.Repórteres ao milhares cercaram e trataram da obrigação de um atleta de futebol um fato “fenomenal”.
A história do eterno menino de Bento Ribeiro–– cujo nome identifica oficialmente uma das ruas do bairro–– sustenta peculiaridades pouco convencionais nos gramados mundiais. Ele, para quem não se recorda, já sofreu três graves lesões no joelho, as quais poderiam acabar de uma vez por todas com sua carreira profissional como jogador.
O gol de ontem, fora a circunstância de saúde mencionada, veio depois de aproximadamente um ano de jejum do “craque”. Uma sede que ele, seus fãs e a imprensa estavam esperando matar o mais rápido possível. A euforia levou Ronaldo a correr desesperadamente, pular no alambrado do estádio Prudentão e provocar, pela energia da torcida corintiana, o entortamento do objeto por onde se pendurou. Somam-se os minutos no qual o gol foi marcado, nos acréscimos da etapa final, no clássico mais importante da maior cidade do país.
Todas as características envolvendo o único gol marcado pelo “timão”, no mundo das chuteiras, carregam valores notícia. Porém os jornalistas supervalorizaram as notícias concernentes ao assunto, exagerando. Programas jornalísticos gastaram tempos preciosos na televisão com questões cuja utilidade pública é extremamente duvidosa. As condições da saúde do joelho de Ronaldo e sua persistência em continuar jogando é um belo exemplo de garra para a população. Mas muitas outras coisas secundárias foram comentadas na TV na noite de anteontem.
Ao que parece em toda a cobertura é a tentativa de montar um espetáculo e engrandecer ainda mais o ídolo brasileiro. Em meio a tantas desgraças no planeta e em época complicada de audiência para a televisão, que vem perdendo telespectadores a cada ano, engrandecer um evento gera interesse nas pessoas e tendem a levá-las a querer ficar inteiradas, informando-se e assistindo programações voltadas a tal acontecimento.
As atenções e elogios insistentes ao jogador forçam um sentimento de importância e mesmo de admiração além do merecimento. Uma estratégia esperta e antiga formulada por patrocinadores e a mídia. Excluindo o envolvimento com os travestis e os erros de Ronaldo —por mim desconhecidos—mencionados por Cléber Machado em sua narração de domingo , a maioria dos meios de comunicação só se referem ao atleta com adjetivos positivos.
Os resultados no seio da população são bem eficazes. Brasileiros se orgulham de terem nascido no Brasil de talentos; esquecem parcialmente dos problemas; e dos maus exemplos das figuras políticas do país, configurando-se um clima que ameniza o negativismo popular e o foco da população de cima das corrupções e injustiças que a maltratam.
O assunto Ronaldo é somente um dos muitos maus exemplos. Os programas de fofoca que existem em nossa televisão enchem de porcarias a mente dos telespectadores. Os papparazi flagram comportamentos os mais banais e ridículos possíveis, com consentimento do jornalismo de algumas emissoras descompromissado com a informação indispensável ao povo.

UM SINAL DE MELHORA
Contudo, vê-se o surgimento de programas preocupados em prestar serviços e instruir a audiência. Muitos programas policiais saíram do ar nos últimos anos, os quais traziam basicamente notícias de violência e que eram coletadas em cima do fato, várias vezes sem a necessária apuração cuidadosa. No horário das seis o Aqui Agora do SBT não deu certo em sua segunda fase. Mas hoje na grade da emissora o programa Olha Você tem pautas diárias que de alguma forma buscam ajudar o telespectador em seu dia-a-dia, em sua vida.
Na empresa de Silvio Santos e na de Edir Macedo –– sem o extinto Cidade Alerta––
o departamento de jornalismo investiu e produz matérias de qualidade, abordando temas biológicos, de meio ambiente, de saúde e alimentação, política, geografia, história, cultura e uma gama de outros importantes para a ampliação do conhecimento de mundo da audiência.
SBT Realidade, Domingo Espetacular, Câmera Record, Repórter Record contribuem a construir um Brasil com uma melhor instrução de ensino e redimem o vexame dos jornalistas nos casos Isabela e Eloá. Em ambos e principalmente no último houve um abuso gritante da liberdade de atuação da mídia, parcialmente culpada na tragédia de Santo André.
O desenvolvimento do telejornalismo está a ser constatar. Falta, porém, uma longa caminhada para se atingir o ideal. Os desrespeitos da imprensa talvez mereciam a agressividade da censura, que na verdade é violenta somente para aqueles interessados com o bem alheio.De qualquer maneira, proibir conteúdos é uma media perigosa.Para evitá-la é preciso o cumprimento da ética e da justiça, obedecendo a lei de imprensa.
A TV, afinal, é um bem pertencente a todos os brasileiros. Logo, ela tem de oferecer-lhes informações de utilidade pública e que não agridam a quem assiste. Sem seguir os conceitos e regras, muitas emissoras merecem ser multadas e perder suas concessões. Isso fica para uma próxima conversa.

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